sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Poupem-nos dos detalhes sórdidos

Quando era pequeno, lembro-me claramente, houve o incêndio do edifício Joelma, e a imprensa televisiva estava lá, registrando a tragédia.

Tem uma imagem que não sai da minha memória. Algumas vítimas do incêndio resolveram se jogar dos andares altos, pois já não aguentavam o calor, a camera registrou e, se não me engano, era a repórter Glória Maria que estava relatando a tragédia. Lembro-me dela dizendo: "não, não se jogue, pelo amor de Deus, não se atire...". Alguns se jogaram e a camera acompanhou a queda, mas quando chegou perto do chão, o cinegrafista parou e deixou o corpo sair do quadro. Já estava mais que explícito o que aconteceria com o pobre que não suportou o calor.

As imagens foram fortes, mas o cinegrafista, por iniciativa própria, não registrou a cena mais cruel, que seria o corpo se esborrachando no chão. Como seria a cobertura hoje em dia? Claro que vários cinegrafistas teriam esta imagem, mas será que colocariam a cena no ar, em tele-jornais das TVs abertas?? No YouTube as imagens estariam disponíveis certamente, mas para chegar até elas você tem que procurar, baixar e ver.

Fico cada vez mais preocupado com a insensatez da nossa imprensa. Essa história trágica do menino que foi arrastado pelos ladrões do carro. Fico chocado toda vez que leio os títulos aqui na internet, pois já não vejo mais televisão. Acredito que antigamente, quando a imprensa ainda tinha um pingo de bom senso, pouparia os leitores e espectadores de relatos mais cruéis.

Sim, o que aconteceu foi uma tragédia. Os assaltantes, mesmo que não soubessem do menino, não deixam de ter toda a culpa pelo acontecido. Acredito que se tal fato passasse alguns anos antes, a imprensa daria bastante destaque para esta notícia, mas os relatos seriam mais contidos, sem tantos detalhes sórdidos.

Respeito aos familiares, ao público, aos pais de outras crianças. Sensibilidade, é o que está faltando aos editores da grande mídia. As tragédias acontecem, não há como evitá-las, mas detalhar isso para todos não é o melhor caminho. Imaginem quantas pessoas ficarão com mais medo do que já tem, os pais vão preferir deixar as crianças em casa porque é mais seguro. Nada trará a criança de volta, mas vender jornal em cima da tragédia e desespero dos outros é quase como chutar cachorro morto, além do mais, para isso, existe uma mídia específica, aquela que se espremer sai sangue.

Claro que é importante noticiar, mas poupem-nos dos detalhes sórdidos.

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